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Telessaúde de Estilo de Vida e Bem Estar

Autores: Chao Lung Wen e Mariana Mie Chao

Com a aceleração nas transformações digitais, expansão e consolidação das hipeconexões proporcionados pela Internet móvel 5G, Internet por satélite, o aumento dos sistemas interativos, robótica, Inteligencia Artificial, IoT entre outros, teremos naturalmente importantes impactos no sistema de saúde. Possivelmente no lugar da centralização dos processos de cuidados serem baseados exclusivamente nos hospitais, consultórios e clínicas, avançaremos para um modelo de saúde conectada distribuída, onde as residências das pessoas serão os pontos chaves para cuidados contínuos, com maior humanização e redução de riscos, principalmente de contágios de doenças, como ocorre em ambientes hospitalares. Os cuidados em domicílios (Telemulticuidados domiciliares) serão potencializados por aparelhos digitais, como por exemplo os termômetros e esfigmomanômetro digitais, aparelhos para exames de orofaringe e otoscopia, oxímetro digital, monitor doppler, glicosímetros, aparelhos para monitoramento  de anticoagulação, balanças digitais com bioimpedância entre outros.

A população mundial está vivenciando um processo de aumento de expectativa de vida e da população idosa. Segundo dados coletados na pesquisa feita em 2021 pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), dos 210 milhões de brasileiros, 37,7 milhões são pessoas idosas (60 anos ou mais), número que representa 17,9% da população do país. Em 2019, o IBGE indicou que em 2034 o percentual da população acima de 65 anos vai atingir 15% de toda população brasileira e em 2060 este índice será de 25,5%. Esse envelhecimento populacional exigirá um investimento de cerca de R$ 50,7 bilhões em saúde entre 2020 e 2027. Dependendo do modo que se envelhece, as pessoas apresentam  um estado de maior fragilidade físico e mental, com maior ocorrências de doenças crônicas, degnerativas e neoplásicas, provocando maior risco de declínio funcional, hospitalização, sequelas, dependências e morte. A ampliação dos conjuntos de ações possíveis na saúde indica também a necessidade expandirmos para abordagens multiprofissionais,  com a organização de linhas de atenção a saúde para resolução de problemas, minimização do risco de ressurgimento ou reagudização das doenças, principalmente as crônicas, e manutenção do estado de saúde por meio da incorporação de novos hábitos e estilo de vida.

Em relação ao custo com cuidados de saúde pessoal, estudos nos Estados Unidos mostraram que os valores gastos pela população idosa representavam quase 4 vezes mais do que os da população com menos de 65 anos. Acredita-se que este custo poderá ser moderado se for implementado  melhoria nas condições de saúde dos idosos com ações prevenção. A Inglaterra difundiu e aplicou diversas ações de prevenção nas residências, que têm sido apoiadas por pesquisadores. Eles afirmam que deste modo haveria redução da necessidade de internação e utilização de serviços hospitalares e, consequentemente, menos gastos. No panorama do Brasil, o estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros (Elsi-Brasil), realizado em 2018, apontou que 75,3% dos idosos brasileiros dependem exclusivamente dos serviços prestados no Sistema Único de Saúde (SUS). (DIEESE, 2021) Já a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) relata que em 2022, no setor de planos de saúde, já somam 7 milhões de pessoas com mais de 60 anos beneficiárias em planos com assistência médica, o que representa 15% do total (ANS, 2022). Em 2018, a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) publicou que a maior longevidade da população impacta diretamente nos planos de saúde. Dados do Instituto de Estudos da Saúde Suplementar (IESS) revelam que “um paciente com menos de 18 anos custa ao ano R$ 1.500 para seu plano de saúde, enquanto um com mais de 80 pode gerar gastos de R$ 19 mil por ano” e complementa que “o custo assistencial médio por beneficiário dos 54 aos 58 anos é de R$ 3.988,23, enquanto que, a partir dos 59 anos, sobe para R$ 8.036,35 (mais que o dobro)” (ANAHP, 2018). De acordo com a ANS, essa maior longevidade gera maiores custos médico-hospitalares e prevê que até 2030 os gastos com despesas assistenciais no Brasil deverão crescer até 157%, passando de R$149 bilhões para R$383 bilhões (ANS, 2022). Isto nos gera um alerta de que é preciso um cuidado e uma conscientização em relação a manutenção da saúde e estilo de vida. Por isto, o ambiente em que se vive deve ser favorável e saudável, para um envelhecimento bem-sucedido, independente e autônomo. O ambiente no qual o idoso reside é um dos aspectos essenciais, pois nesta fase ele passa a maior parte do tempo nela e a qualidade deste espaço está diretamente relacionado ao bem-estar que se é proporcionado, devendo, assim, ser planejada de modo a minimizar os riscos de acidentes domiciliares, proporcionando segurança, conforto, independência, autonomia e qualidade de vida saudável.

Os dispositivos vestíveis (wearables) com recursos de monitoramento de sinais biológicos (biossensores e dispositivos de diagnósticos usando bio-marcadores) mudarão a forma de assistência à saúde, popularizando os cuidados pessoais (personal ecare). A popularização de dispositivos eletrônicos domésticos com Inteligência Artificial (alto falantes inteligentes e/ou com recursos para vídeo chamadas) tornarão comuns Moradias e Residenciais Inteligentes com possibilidade de serviços. Este cenário abrirá novas perspectivas para oferta de serviços de telemonitoramentos e teleorientações associado a uso de dispositivos para realização de autoexames. Por isso, estas serão as características do novo ecossistema de saúde para a Sociedade 5.0 (termo criado no Japão, em 2016, para considerar a nova organização social após a 4ª Revolução Industrial), em que o sistema de saúde será reorganizado para um cenário social com grande número de idosos, que são cada vez mais longevos, sendo necessária a criação da Saúde Conectada 5.0. Com a aceleração das mudanças da 3ª década do século 21, certamente a inclusão das Tele Tecnologias Assistenciais serão o pilar central da reorganização da cadeia de saúde para uma sociedade envelhecida.

A Saúde deve ser vista não apenas como serviços para o tratamento de doenças, mas como um conjunto organizado de serviços que, além de recuperar as pessoas de condições de doença, primeiramente promove a saúde e previne doenças, por meio do provimento de Telessaúde de Cuidados Biopsicossocial, oferece também serviços integrados.

Um Ecossistema de Telessaúde Integrada deve ser constituída por um grupo multiprofissional: agentes de saúde, profissionais não médicos com contato direto com grande número de indivíduos, população geral, médicos generalistas e especialistas, arquitetos habitacionais, engenharia de saneamento entre outros.

Para a otimização do sistema de saúde precisa-se de uma abordagem que vai além da medicina, pois ela envolve cuidado integral de pacientes, no diagnóstico, tratamento e recuperação de  doenças (com a integração dos serviços em nível de atenção primária, secundária e terciária), sendo necessária uma ação conjunta de profissionais de diferentes áreas da saúde. O melhor conceito a ser implementado é a Telessaúde de Cuidados Integrados (ou Telessaúde Integrada), que seria caracterizada pela a ação articulada das profissões, convergindo para proporcionar a saúde, com redução de risco e agravos de doenças, melhorar o processo de recuperação dos pacientes, formar redes para otimizar o processo de cuidados (integração e logística), qualificar e capacitar continuadamente os profissionais envolvidos e promover os  autocuidados para a população.

Nos tempos atuais, a Telessaúde Integrada deve ser entendida como um método com grande potencial para agregar novas soluções. Muitos dos procedimentos e atendimentos que são exclusivamente presenciais poderão ser expandidos ou substituídos por interações intermediadas por tecnologias. Isto tende a ser uma possível solução para aceleração dos processos, desde que seja aplicada de forma estratégica para que se integre à estrutura de saúde existente, a fim de aumentar a logística de resolução de problemas e implementar um conjunto de serviços que evitem com que a população venha a adoecer. Os custos com os cuidados às doenças estão cada vez mais altos, por conta do surgimento de novas tecnologias, de novos investimentos e descoberta de novos problemas. O desenvolvimento de estratégias para se eliminar os desperdício é fundamental, pois de acordo com a Agência Brasil, 30% dos gastos em saúde privada no Brasil são desperdiçadas, seja com exames em excesso e internações desnecessárias até procedimentos caros que poderiam ter sido evitados com medidas preventivas. São inúmeros os casos onde o direcionamento incorreto dos recursos acabam gerando despesas sem trazer benefícios aos pacientes. Segundo o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), as despesas com internações foram as principais responsáveis pelo aumento de 19,3% no índice de variação de custos médico-hospitalares observado no ano de 2015. Segundo a IESS, a perspectiva e é que o total de internações de beneficiários de planos de saúde deva saltar de 8,2 milhões para 10,7 milhões até 2030, o que representa um crescimento de 30,5%.

Além de promover o diagnóstico precoce e evitar o agravamento de muitas doenças crônicas, os programas de prevenção podem também empoderar o paciente para cuidar da sua própria saúde (autocuidados), facilitar e orientar a utilização dos serviços de saúde, e são um importante aliado na racionalização de custos e redução de desperdícios nos cuidados de doenças. Um dos principais objetivos de um programa de prevenção e promoção de saúde seria de melhorar os indicadores gerais dos pacientes e evitar o agravamento de quadros de doenças crônicas.

Quando vemos a Saúde não apenas como serviços para o tratamento de doenças passamos então a oferecer serviços integrados por meio do provimento da Telessaúde Integrada para promover Estilo de Vida e Bem Estar, levando-se em consideração as potenciais vantagens de geração de benefícios diretos e diferenciais com a integração de Tele Tecnologias Assistenciais no processo de cuidados em saúde.

A implementação de ações que promovam bem-estar, embora ainda em fase incipiente no país, sistematicamente estruturadas, que integrem desde o nível assistencial até o educacional e motivacional, dentro de uma estratégia de Saúde Preventiva, com a inclusão de uma série de serviços contemplados na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Ministério da Saúde ( portarias GM nº 849/2017 e GM nº 702/2018), que incluem Acupuntura, Ayurveda, Meditação, Práticas Corporais (lian gong, chi gong, tui- na, tai-chi-chuan), Musicoterapia, Biodança, Dança Circular, Quiropraxia, Reiki entre outros.

Apesar da automação residencial ser um facilitador de diversas funções, os os recursos a serem implementados devem ser escolhidos com critérios, pois precisam ser simples e adequados ao perfil dos usuários, ter sistemas de contingências em caso de falhas e ocorrências excepcionais, e implantadas pontualmente, pois estão em constante mudanças e atualização, sendo assim se tornam obsoletas em um curto período de tempo. Em situações que os usuários possuem pouca familiaridade com tecnologia, a automação pode até dificultar a realização de atividades, isto ocorre também quando há falta de energia elétrica ou banda de internet, que impossibilita a utilização dos recursos. Deve haver um equilíbrio entre a quantidade de tecnologia utilizada e o planejamento inteligente das residências.

As residências inteligentes não se restringem apenas à inclusão de um nível de automação com uso de inteligência artificial para auxiliar o dia a dia, mas também em conceber espaços funcionais, seguros e saudáveis nos seus interiores e exteriores, que sejam práticos e flexíveis para múltiplos usos. Neste conceito os novos projetos domiciliares ou adequações ambientais precisariam levar em consideração a escolha de materiais que evitem acidentes e facilitem a higienização por meios físicos, fluxo de ar e/ou incorporação de purificadores de ar, inclusão de dispositivos que proporcionem umidade ambiental adequada e detecções de níveis alterados de monóxido de carbono e gás, iluminação planejada para cada tipo de atividade e necessidade, boa acústica, armazenamento planejado de materiais, proteção contra insetos, uso de sinalizadores e identificadores verticais e horizontais que possibilitem fácil localização no ambiente, e inclusão de bem-estar baseado em musicoterapia, projetos luminotécnicos, aromaterapia, paredes com paisagens imersivas, entre outros, para proporcionar conforto e resgate emocional.

A moradia que possui dispositivos eletrônicos integrados, mas fisicamente seu espaço tem um planejamento inadequado, como por exemplo ser suscetível à acidentes, apresentar barreiras físicas e visuais, entre outros, não podem ser consideradas inteligentes. A inteligência, seja por inclusão de automação ou bom planejamento do design de interiores, vem para trazer soluções, facilidade e conforto, não para gerar maiores problemas.

Esta inter-relação das residências com a área da saúde, sendo elas integrantes do Ecossistema da Saúde Conectada, muda completamente a perspectiva do envelhecimento, tonando-o digno, integrado, socialmente relevante e economicamente sustentável. Além disso, ressignifica o conceito de lar inteligente.

Pontos de destaque

Para organizar serviços Telessaúde Integrada, deve-se levar em consideração os potenciais de geração de benefícios diretos e vantagens diferenciais ao incluir as teletecnologias assistenciais na cadeia de de saúde. São eles: melhoraria da eficiência (Linhas de Cuidados em Saúde), redução de desperdícios (duplicação ou triplicação de exames, morosidade, deslocamentos desnecessários e sobrecarga de estruturas de saúde), otimização dos serviços, ampliação do acesso aos usuários e organização de trabalho de forma distribuida e em rede.

A Telessaúde de Estilo de Vida e Bem Estar é uma iniciativa promissora que pode  melhorar toda a cadeia social da saúde. Embora durante um período ainda possa ser alvo de resistências por dúvidas em relação à sua efetividade, pelo desconhecimento e receio, a sua adoção será uma tendência irreversível no Brasil e no mundo, pois focará em qualidade de vida, sociedade produtiva e redução de sinistros. Esta estratégia será fundamental para as perspectivas 2026 e 2030, com envelhecimento da população mundial e brasileira, o que criará uma série de desafios como aumento de doenças crônicas, câncer, dependência física e cognitiva entre outros.

A inclusão da Aquitetura 5.0 Wellness deverá ser parte integrante da iniciativa, o que fomentará novos conceitos habitacionais convergentes com a Telessaúde e com as Práticas Integrativas reconhecidos pelo SUS, para promoção do Bem-Estar.

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Dr Chao Lung Wen, co-autor deste artigo estará apresentando uma palestra sobre este tema na próxima edição do Painel Lar Inteligente em março de 2023



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